Ela está ali o tempo todo, arraigada nos hábitos e costumes mais corriqueiros. Tanto que a maioria das pessoas nem se dá conta, mas a cultura negra está presente no dia a dia do brasileiro. Os traços deixados pela população negra, sobretudo africana, estão na culinária, na música, religião e até mesmo no vocabulário.
Os africanos chegaram ao Brasil no século XVI, oriundos de diversos países, arrancados de suas vilas pelos exploradores europeus para o trabalho escravo nas colônias. Em solo brasileiro, desembarcavam em cidades como Salvador e Rio de Janeiro. Apesar da dor da diáspora e das obrigações que lhe eram impostas, o que inclui a conversão para a religião católica, os africanos trouxeram consigo uma riqueza incomensurável e, aos poucos, foram incorporando na vida naquela terra estrangeira.
Identidade brasileira tem a alma negra
A união entre a cultura negra, europeia e indígena é a combinação basal da identidade brasileira. A contrário da cultura impositiva herdada dos colonizadores, os costumes da população afrodescendente, cultivados na senzala, chegaram à “casa grande” pela porta dos fundos. Então, foram ganhando espaço na cozinha, com ingredientes e novas formas de preparo de alimentos; atravessaram os corredores e chegaram aos salões nobres, com instrumentos musicais e ritmos que embalavam as festas. As vestes coloridas e a expressão corporal marcante e alegre, demonstradas durante a dança, também foram conquistando os brancos, sendo cobiçadas principalmente pelas mulheres.
É difícil pensar hoje sobre como seria o Brasil se não fosse a contribuição africana na cultura geral. Será que o povo teria essa fama internacional de alegre, hospitaleiro e com uma das mais apreciadas gastronomias do mundo?
Muitos movimentos brasileiros hoje enaltecem a cultura negra e se mantém firmes no propósito de disseminar a história de seus ancestrais, mantendo viva as tradições e combatendo ignorância e preconceitos. E há muitos locais públicos e privados espalhados pelo Brasil, que valem a pena ser visitados quando o assunto é valorizar esse traço único da nossa cultura.
A cultura negra pelas ruas de Salvador
A capital da Bahia é conhecida como a cidade mais negra do Brasil. A cada 10 soteropolitanos, 8 são negros. Fundada em 1549, São Salvador foi a capital do país por 214 anos. Sua economia se desenvolveu a partir da atividade portuária e também graças aos engenhos de açúcar da região, que tinham nos escravizados a sua força de trabalho.
Toda a riqueza histórica e cultural de Salvador tem sua base na população negra. Na culinária, por exemplo, o vatapá, o acarajé, a moqueca, o caruru, entre tantos outros pratos, não existiam antes da chegada dos africanos. Foram as cozinheiras negras que incorporaram inúmeros ingredientes nas receitas, como o leite de coco, o gengibre, a pimenta malagueta, os feijões, as ervas aromáticas e até o amendoim.
Os blocos afro, como Ilê Aiê, Olodum, Muzenza e Afoxé Filhos de Gandhy, que foram criados como instrumentos de combate ao preconceito, hoje são símbolos da cidade. As apresentações e ensaios atraem milhares de turistas interessados em ouvir as músicas marcadas pelos atabaques, rebolos, cuícas, pandeiros, bongos etc. do grupo. Inclusive, a maioria desses instrumentos musicais foram criados pelos africanos escravizados.
União dos Palmares – símbolo da resistência negra
A 80 quilômetros de Maceió, em Alagoas, mais precisamente na Serra da Barriga, está situado o Parque Memorial Quilombo dos Palmares. O local remonta o cenário da maior resistência negra da história dos escravizados das Américas. Comandado por Zumbi dos Palmares, o quilombo foi o maior acampamento de refugiados do século XVI. A data da morte de Zumbi, em 20 de novembro de 1695, motivou a criação do Dia Nacional da Consciência Negra.
Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o local abriga, até hoje, comunidades quilombolas. Além das edificações reconstituídas numa espécie de maquete em tamanho real, o Memorial também se destaca por mirantes com vistas incríveis da Serra da Barriga, além de restaurante que oferece pratos da culinária afro-brasileira. No site do parque, é possível também fazer um passeio virtual pelo local.
Memória negra em São Paulo
Dentro do famoso Parque Ibirapuera, fica o Museu Afro Brasil, considerado o que melhor conta sobre a diáspora negra. Com um acervo de mais de 6 mil itens, entre pinturas, esculturas, fotografias, documentos e peças etnológicas de autores brasileiros e estrangeiros, produzidos entre o século XVIII até os dias atuais. Além da exposição permanente, o museu recebe mostras itinerantes, abriga uma biblioteca com mais de 12 mil títulos especializados em assuntos ligados a negritude, além de um auditório para eventos e cursos. O valor do ingresso inteiro para visitar o museu é R$ 15,00 e pode ser adquirido pela internet.
Casa dos Contos, em Ouro Preto
Localizado na cidade mineira de Ouro Preto, o Museu Casa dos Contos foi organizado com o objetivo principal de preservar a memória do Ciclo do Ouro, no qual a cidade teve influente papel. O casarão em estilo barroco foi construído entre 1782 e 1787 por um banqueiro da época e foi usada como sede da administração pública contábil. O espaço abriga exposições temporárias de artistas brasileiros e estrangeiros, e o acervo permanente conta a história do dinheiro produzido pelos garimpos e dos senhores que enriqueciam às custas do trabalho de negros escravizados.
Iniciativa pública
Em 1988, foi criada a Fundação Cultural Palmares, instituição federal que tem como objetivo promover e preservar culturais, históricos, sociais e econômicos da população negra na estruturação da sociedade brasileira. O site da FCP concentra agenda de eventos, informações históricas e iniciativas da temática negra, sendo uma rica fonte de informação sobre o assunto.
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